quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Chinsagu No Hana - a Nudez e o Nu

Pensar a nudez e o nu... Pensar o que desnudamos quando tiramos a roupa.

Muito recentemente, num workshop de Butoh dirigido pelo grande artista japonês Tadashi Endo, tive a impressão de ver a alma dançando. Fui a esse workshop por causa do filme Hanami – Cerejeiras em Flor, em que pela estranha dança oriental, os personagens se comunicavam com os mortos.

Foram movimentos leves e mínimos os que nos instruíram a fazer, na lentidão característica do que não se automatiza. Sai do workshop em êxtase. Experimentei o corpo como me agrada pensá-lo: uma capa para alma.

No dia seguinte, uma experiência cotidiana: a caminho da padaria, numa banca de jornal do bairro, observo que a maioria das participantes do insólito Big Brother Brasil exibe seus corpos em diferentes revistas. Lá estavam elas, as últimas mulheres mutantes, com seus corpos a venda mais uma vez.

O corpo e a alma: a nudez do nu.

Se emprestarmos uma alegoria de um belíssimo filósofo do século passado, diríamos que o corpo inteiro é um rosto. Uma delicadeza desconcertada, o humano no Homem se apresenta como a vulnerabilidade irreproduzível de uma face. Naquilo que ele tem de singular, para Emmanuel Levinas, o rosto é fragilidade. Em corpo inteiro, para mim, esse rosto que somos é a alma que dança o corpo no Butoh.

Pensar a nudez então como um desabrigar daquilo que está desabrigado. O nu como uma dimensão ontológica.

Ultima cena:

Lembro-me de quando eu era criança e me deparei com uma revista pornográfica. Senti um fascínio incontrolável e uma náusea muito particular. O fascínio era a excitação do medo, a náusea era o efeito do choque. Voltei a essa revista inúmeras vezes, voltei ao medo e a náusea até aprender a me descarregar deles de forma efetiva. Trauma, repetição e gozo. A psicanálise nos ensina que a infância nunca acaba ainda que nunca mais sejamos crianças

Sedução e abandono:

Um corpo que se despe diante de olhares que não vêem o nu em sua nudez. Um corpo que despido, inclusive de si, brutaliza, com sua nudez, o olhar.

Mulheres encouraçadas e um corpo sem psique.

O feminino que se vê diante da sexualidade sem ternura, de uma cultura que tem pelo corpo um fetiche e o transforma num objeto sem imperfeições, ou seja, sem sofrimento.

Narcisismo em consumo: Corpos que valem mais quanto maior a perda de inocência.

A alma se esconde ao assalto e a personalidade se divide em partes incomunicáveis. Os corpos gladiadores, produzidos por horas de academia, hipnotizam pela ausência de rosto. Mas que onanismo é esse que praticamos em massa, e o que são esses corpos imaginários a quem podemos fazer qualquer coisa?

A nudez como violência e o segredo do Butoh.